sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Olhe Para o Lado Certo




Sou gêmeo univitelino. Meu querido mano, Ricardo, está mais gordo do que eu. Eu ficava descansado com a minha situação. Eu não estava bem, mas ele estava pior. Um dia passei mal e fui hospitalizado. E aí, na dor, me conscientizei de que deveria olhar para mim, e não para o meu irmão. Deveria cuidar de mim, dos meus males, e, por amor, alertar os outros para que não cometessem o mesmo erro que cometi.

Percebi que isso também acontece na vida espiritual. Na verdade, existe um caminho muito perigoso, que costuma fascinar muitos crentes. É quando ele fica focado nos erros e pecados dos outros, e se esquece de si mesmo. E há pessoas que são rigorosíssimas com os outros em áreas em que elas são muito boas, mas se esquecem de áreas das suas vidas em que elas precisam, urgentemente, de tratamento.

Era exatamente contra isso que Jesus se batia nas Escrituras. Ele chegou a falar de gente que é capaz de fazer uma viagem longa para conseguir um aliado para as suas críticas, mas que é incapaz de levantar um dedo mindinho para resolver os pecados do seu coração. Ele enxerga tudo nos outros, só não vê a dureza do seu coração. É por isso que a Bíblia diz que “a letra mata, mas o espírito vivifica”. Aos peritos na arte de julgar os outros não lhes sobra tempo para cuidar da sua vida.

Nós precisamos parar e pedir a Deus que sejamos mais compassivos com o pecado dos outros, e menos complacentes com os nossos pecados. Mas o que fazemos? Usamos os erros dos outros como álibi para o nosso próprio mal. Afinal, quando criticamos os pecados dos outros, e nos abstemos de cuidar do nosso próprio mal, damos uma fascinante impressão de que somos melhores, e mais espirituais. E isso faz muito bem ao nosso ego, porque aos olhos dos homens parece que estamos bem. Só que a reputação da gente não pode estar conectada aos homens, mas a Deus.

O legalismo sempre trata com dureza os outros, mesmo que estejam cometendo pecados que eu também cometo. Quando a mulher adúltera foi trazida a Jesus, para que ele a condenasse, ele surpreendeu a todos, dizendo: “quem estiver sem pecado que atire a primeira pedra”. Não sobrou ninguém para atacá-la. E que bom se isso acontecesse com a gente.

Você percebe bem os impulsos do seu coração? E em vez de se voltar pra Deus, dizendo: “Tem misericórdia de mim, Senhor, e trata o meu coração!”, tem criado farsas para se livrar das acusações da sua consciência? Ou, quando muito, diz: “Está bem, eu faço, mas não faço sozinho”.

A lei não transforma coração. Ela só se ocupa das áreas externas da minha religiosidade. É Jesus e a Sua graça que focalizam o coração. A podridão interior do seu coração, ainda que não vista pelos outros, deveria ser o foco da sua alma constantemente. É exatamente isso que a Bíblia fala que aconteceria quando o Espírito Santo entrasse no seu coração. Ele o convenceria do seu pecado, não do pecado dos outros.

Há pessoas que adoram jogar pedras nos outros. Jesus morreu não só para me salvar, mas também para me santificar. E purificar as intenções e motivos do meu coração. Ele morreu para que o foco dos meus olhos espirituais seja a cruz e o meu coração. E é ali na cruz que entro em contato com a minha maldade, e sou denunciado, e me torno sem defesa diante de Deus. Mas é ali também onde posso ser curado do veneno que só vê a maldade do outro. Então, pare de olhar para os outros. Olhe pra Jesus, autor e consumador da fé, e também para o estado do seu coração. Trate de você. Deus sabe como tratar os pecados dos outros.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

As Três Conversões Cristãs




Existem três tipos de conversões na história das nossas vidas. Fala-se muito pouco nelas, mas são essenciais para uma vida cristã abundante.

A primeira conversão é a dos deuses falsos para o único Deus verdadeiro. Há muitas pessoas, hoje, no mundo, que servem, seguem e adoram a deuses falsos. Aqui no Brasil, em particular, temos uma religiosidade sincrética e estranhíssima. Lá no nordeste encontramos uma devoção muito forte ao Padre Cícero. Então, você pergunta às pessoas: “A quem estão seguindo e adorando?” E elas respondem: “Ao padim padre Cícero”. E ali estão pessoas que se denominam cristãs, reunidas numa igreja também chamada cristã, mas que seguem ao Padre Cícero, e não a Jesus Cristo.

Há no mundo uma vastidão de deuses, poderes e entidades. Quando o apóstolo Paulo chegou ao areópago, na Grécia, encontrou altares a tudo quanto é deus. Calcula-se que, naquela época, havia mais de 30 mil deuses em Atenas. Hoje não é muito diferente. Há religiões em que o deus é o próprio “Eu”. Você já reparou como é complicada a conversão de uma pessoa que adora a um deus falso para o único Deus verdadeiro?

Numa conversão assim, você abdica de tudo quanto cria antes. Você se despoja de todas as orações, confissões, rituais, e volta-se para o Deus revelado na pessoa de Jesus. A pessoa muda o foco da sua adoração. Ela não quer mais adorar Ogum, não quer mais adorar ao Padre Cícero ou a alguma outra entidade. Algumas pessoas estão tão ligadas aos rituais antigos que lhes custa muito essa mudança. Sem contar aquelas que receiam ser alvo de alguma maldade dessas entidades, pelo fato de terem vivido anos sob sua influência. Por tudo isso é que a conversão de um deus falso para seguir ao único Deus verdadeiro tem de ser radical. A pessoa abdica e rejeita a tudo o que fazia, e se entrega por inteiro ao Senhor dos senhores.

A segunda conversão é também muito dramática: a do nosso “Eu” ao domínio completo do Senhor Jesus. É luta pra toda a vida. Nessa conversão é preciso que haja uma rendição dos nossos sonhos, dos nossos desejos e planos, e submissão de tudo isso a Jesus. A pessoa para de lutar pela sua própria reputação e a transfere para Jesus. É coisa dificílima porque o nosso “Eu” é um deus em nós. E todos gostamos de estar no controle da nossa vida, de governar a nossa história e mandar no nosso destino. Mas Jesus nos convida a um roteiro inverso. O convite é para que paremos de lutar com nossas armas, e nos rendamos a Ele, deixando que Ele seja Senhor absoluto da nossa história. Nessa mudança, deixamos que Cristo cresça em nós a cada minuto, a cada hora e a cada dia.

A terceira conversão é a do nosso bolso. Alguém disse que o nosso bolso é o último a se converter e o primeiro a esfriar. O Dr. João Filson Soren dizia, brincando, que as pessoas deviam ser batizadas com suas carteiras também. Mas não existe nenhuma fé no mundo em que você não tenha que participar com seus recursos. Algumas religiões são até exageradas nos requerimentos que fazem. A Bíblia nos mostra religiões pagãs que exigiam sacrifícios da família. Não que compremos as bênçãos de Deus com os nossos bens, mas Jesus já disse que “onde estiver o nosso tesouro aí também estará o nosso coração”. Ou seja, investimos, colocamos dinheiro, naquilo que amamos. E se amamos a Deus, a contribuição voluntária para o progresso da Sua Obra será algo natural. Deus nos dá com abundância e com fartura, e nós sentimos prazer em sermos fiéis a Ele também.

A minha experiência diz que todas essas conversões são obras marcantes do Espírito de Deus em nós. E o resultado de tudo isso é plena comunhão com Deus, e com o Seu povo. Então, essas três conversões já aconteceram na sua vida?

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Choro Atrasado

Davi foi chamado de “homem segundo o coração de Deus”, na Bíblia. Ele foi um cara excepcional, mas fracassou como pai. É dele uma das cenas mais tristes em toda a Bíblia. Seu filho Absalão se voltou contra ele, e decidiu usurpar o trono do próprio pai. No meio daquela guerra, o exército de Davi, finalmente, matou Absalão. Quando a notícia chegou aos seus ouvidos, Davi ficou amargurado, com um sentimento profundo de vazio na alma, e chorou pelo filho. Um choro tardio.

Tenho visto pais chorando os seus erros e omissões. Já vi muitos pais cheios de remorsos porque se apequenaram no lar. Eles fizeram muitas coisas pela casa, mas não trabalharam no coração dos seus filhos. E hoje choram a falta de diálogo, de confrontação e de disciplina.

Como Davi, choramos atrasados quando perdemos a autoridade moral e espiritual dentro do lar. Amnon, filho mais velho de Davi, se apaixonou pela bonita Tamar, sua mana. E arquitetou um plano para possuí-la. Estuprou a irmã e a botou para fora do palácio, como se joga um lixo na rua. Aquilo era um crime assombroso, mas Davi se omitiu. Ele não o corrigiu nem o confrontou. É que esse estupro aconteceu logo após a sua queda. Davi havia se envolvido com uma mulher casada, e ainda mandado matar seu marido. E ele agora tinha dificuldade em lidar com o problema de casa, porque não tinha autoridade moral para falar com seu filho.

Isto acontece, hoje, em casas onde o pai desonesto quer ser moralista com o filho adolescente que se envolve em transgressões; onde o pai fumante quer da bronca no filho que fuma e onde o pai que bebe tem de encarar os primeiros arroubos do filho com álcool. Infelizmente, vejo pais mendigando autoridade sobre os filhos, quando os filhos precisam desse comando paterno no lar.

Como Davi não fez nada com Amnon, Absalão matou-o traiçoeiramente, e foi viver exilado por três anos. Depois disso voltou para Jerusalém. Mas Davi disse: “Pode vir, mas não quero nem ver a sua cara”. E assim Absalão ficou muitos anos sem se aproximar do pai. Quando o procurou, Davi não lhe deu atenção. Tudo o que fez foi lhe passar um perdão judicial. Se naquela hora Davi parasse, olhasse para o coração do filho, e chorasse com ele, o filho não teria arquitetado um motim contra ele.

Como Davi, também choramos atrasados quando deixamos de mostrar afeto pelos nossos filhos. Vivemos numa sociedade que diz que não podemos disciplinar nossos filhos, mas ninguém está reclamando quando não mostramos afetos por eles. Estão faltando lágrimas em nossos corações. Pais precisam chorar com os filhos, e os filhos, com os pais. Pode ser que você não consiga dizer nada, mas chegue junto, chore diante do seu filho agora, para não chorar tarde demais.

Cuide para que seu filho saiba que você não é uma coisa gelada e estéril, mas que é uma pessoa com afetos, com amor, e muito acolhimento no coração. Querido pai, não chore atrasado.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

" O Camburão"

Camburão era o nome dado ao carro de polícia que fazia rondas pela cidade. Pessoas suspeitas, geralmente negros, bêbados ou pobres, eram abordadas pela Polícia Civil. Os policiais saiam da viatura e exigiam a identificação da pessoa. Caso fosse constatada alguma irregularidade, a pessoa era detida, e levada para a delegacia, na traseira do veículo.

“Camburão” era também o apelido que meus colegas davam ao meu pai. Não poucas vezes, antes mesmo de ele avistar a mim ou aos meus irmãos, éramos avisados pelos colegas: “Renato, ‘o camburão’ está lá no bloco D”. Ou: “Ricardo, vi seu pai no bloco A”. Ou ainda, “Jeiel, seu pai andou procurando vocês”.

É que, apesar de sair muito cedo para o trabalho e chegar depois das 20h em casa, meu pai tinha o costume de sair e procurar cada filho. Queria saber onde estávamos, com quem e o quê fazíamos. Quando nos via, ele nos abraçava, beijava, e expressava alegria e amor por nós. Não poucas vezes, ele também nos cheirava, para perceber resquícios de fumo. Ele bem sabia que a juventude daquele lugar vivia em busca de novidades e aventuras. Sabia que adolescentes são suscetíveis ao grupo. No dizer de Rubem Alves, são verdadeiras maritacas, que gostam de fazer tudo em bando. Papai sabia que era muito difícil não se deixar dobrar pela influência dos outros. Então, mesmo cansado, todos os dias saía à nossa procura. A expressão ainda não havia sido cunhada, mas papai, “o camburão”, fazia com que pagássemos o maior mico diante dos colegas. Sentíamos uma vergonha enorme por causa dele. Dos seis blocos de apartamento daquele condomínio, ele era o único pai que, diariamente, andava a procura dos filhos.

“O Camburão” também tinha regras claras. Só podíamos ficar na rua até às 22h. Muitas vezes questionávamos aquela ordem, dizendo: “nós somos os únicos que temos de chegar a casa às 22h. Todos os nossos amigos ficam na rua até muito mais tarde”. Papai, “o Camburão”, não se comovia. Os outros não eram filhos dele. Os dele, ele cuidava.

Vi quando muitos daqueles colegas começaram a se envolver com drogas, por pura curiosidade e brincadeira. Infelizmente, assisti de perto o processo de degradação de outros. Testemunhei o desespero por dinheiro. Vi filhos de gente boa vendendo roupas de grifes por ninharia, depois arrombando carros, para conseguir dinheiro pras drogas. Nunca vi seus pais lá na rua fazendo rondas. Logicamente, não viram nada disso. Entendi, então, quando o governo lançou uma campanha antidrogas com o seguinte slogan: “seja pai do seu filho, antes que um traficante o adote”. Enquanto isso, “o Camburão”, meu pai, continuava a sua rotina de rondas. Benditas rondas.

Aquelas rondas chamavam-se amor, pois quem ama cuida. Aqueles limites, que tanto me envergonhavam, chamavam-se zelo. E aqueles constrangimentos diante dos colegas tornaram-se saudosas recordações de um grande amigo. Hoje, agradecemos a Deus pelo “Camburão” que marcou e abençoou as nossas vidas.

A você, pai, cuja vida tem sido um exemplo de retidão, amor, zelo e dedicação aos filhos, contando esta história, rende-lhe homenagem um filho saudoso, que foi amorosamente detido pelos braços de um “Pai-Camburão”.